ECA: onde estão os adultos? Brincando de arminha?

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O vínculo entre educação, cidadania e política transcende laços que entretecem os interesses que se plasmam na educação e na política como atividades centrais das sociedades contemporâneas, pois concerne à universalidade do político e do educativo, aos processos de regulação e de encalce, condução e suposto controle sobre os destinos da humanidade e de cada um dos humanos. (MORIN, Edgar; DELGADO, Carlos., 2016, p. 3)

 

Apesar dos esforços de educadores e juristas para explicar o ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente, ele ainda continua sem ser bem entendido, ao que parece. Maurício de Souza até desenhou, para ver se o povo entendia e ainda precisamos ouvir absurdos relacionados ao desconhecimento.

No dia 13 de julho de 1990, portanto, há quase 3 décadas, o ECA foi assinado no Brasil. Este conjunto de leis a a ver a criança e o adolescentes como sujeito de direito. Isso não quer dizer que este ser tenha direito a tudo, sem ter deveres. Quer dizer que, a partir deste conjunto de leis, esta pessoa existe e precisa ter seus direitos protegidos e garantidos pelo Estado, pela família, por toda a sociedade, conformada por adultos.

Mas, onde estão os adultos? Brincando de arminha?

No artigo 60, por exemplo, aprendemos que:

Art. 60. É proibido qualquer trabalho a menores de quatorze anos de idade.

Qualquer trabalho é qualquer trabalho, sabem? Qualquer um mesmo!

E se pararmos para pensar com tranquilidade, o Estatuto nem está protegendo tanto assim porque na verdade, a partir dos 14 anos, ocorre uma massa de evasão escolar absurda e quase incontida, na escola pública, obviamente. Nesta idade perdemos muitos jovens para o mercado de trabalho, para as drogas e para o crime. Perdemos porque saem da escola. Não estou falando da escola privada, obviamente. 85% dos estudantes estão em escolas públicas. É sobre o ECA que estamos falando. Mas também é sobre a escola pública. Até porque, em geral, quem coloca o filho na escola privada está pensando em investir mais em educação, na formação e desenvolvimento integral da pessoa e menos em sua entrada imediata no mercado de trabalho.

Por que precisamos que o jovem esteja na escola mais tempo?

Porque se ele vem de família desestruturada, ali pode encontrar apoio, refúgio, compromisso com seu futuro, possibilidades de relações mais saudáveis e de criação de um projeto de vida.

Se ele vem de família estruturada, pode ser, ali, apoio a outros jovens com menos sorte, porque família é sorte, não é escolha desta criança.

A escola é o espaço onde todos podem ser incluídos, socializados. É o lar de muitos jovens. O ECA também abre esta chance de que os adultos entendam que a criança precisa ser ouvida, precisa fazer parte das decisões que tenham relação com ela. Quando desprezamos tudo o que se conseguiu nestes 30 anos de ECA e vemos a criança como potencial força de trabalho, o que estamos fazendo, na verdade é tirar de nossas costas o nosso papel de adultos responsáveis que somos. Precisamos avançar com o Estatuto, melhorá-lo e não ignorá-lo ou invalidá-lo.

 

Referências e sugestões para avançar na temática:

MORIN, Edgar; DELGADO, Carlos Jesus. Reinventar a educação: abrir caminhos para a metamorfose da humanidade. Tradução de Irene Reis dos Santos. São Paulo: Editora Palas Athena, 2016.

Disque 100: saiba como funciona o canal de atendimento – https://bit.ly/30wJKtQ.

Ebook Estatuto https://www.paulofreire.org/eca/

Eca – para baixar – Maurício de Souza http://www.crianca.mppr.mp.br/

FERREIRA, Luiz Antonio Miguel. O Estatuto da criança e do adolescente e o professor: reflexos na sua formação e atuação. 2004. 223 f. Dissertação (mestrado) – Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Ciências e Tecnologia, 2004. Disponível em: <http://hdl.handle.net/>.

O Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA – comentado por Vivian Navajas. Disponível em: <https://www.youtube.com/>. o em: 10/07/2019.

Irene Reis dos Santos

É bacharel e licenciada em letras - Português e Espanhol pela FFLCH - USP, especialista em tradução, pesquisando, no mestrado em Ciências da Educação, sobre participação de estudantes na comunidade por meios de Grêmios. Atualmente, leciona espanhol no Instituto Cervantes, contribui com editoras e é diretora da CORE - Comunidade Reinventando a Educação (coreduc.org), entidade do terceiro setor que fomenta parcerias em prol da educação pública. Irene acredita que as vivências interculturais e a aprendizagem baseada em projetos de vida em comunidade são a chave para o complexo desenvolvimento da sociedade planetária.