O poder das estratégias coletivas para transformar realidades

Cultura de Doação
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Imagem: Pikisuperstar/Freepik

A voz dessa semana é de Sabrina Vida e Julia Brandão, sócias na quivirá e integrantes do Movimento por uma Cultura de Doação.

As mudanças estruturais que queremos ver no mundo — como justiça social, equidade racial e uma transição ecológica mais justa — não podem mais depender apenas da visão ou da boa vontade de algumas poucas pessoas ou organizações. A ideia de que a filantropia se resume a grandes doações feitas por empresas ou pessoas muito ricas já mostrou suas limitações. Mesmo quando bem-intencionadas, essas iniciativas costumam reforçar desigualdades de poder, definir quais temas são prioridade e ignorar as realidades complexas dos territórios em que atuam. Isso tudo acaba afastando a população do engajamento social.

Na prática, a filantropia institucional, feita por grandes fundações, geralmente funciona por meio de processos de aprovação, regras e expectativas definidas por quem doa. Em vez de questionar as estruturas de poder, ela as mantém sob controle. Em vez de lidar com críticas, tende a suavizá-las. Assim, limita o potencial de mudanças profundas.

Além disso, ao reforçar a ideia de que doar é algo reservado a quem possui grandes quantias de dinheiro, esse modelo acaba excluindo a maioria das pessoas do processo de transformação. Muitas deixam de se reconhecer como parte ativa da mudança, como se apenas doações expressivas conferissem legitimidade à ação. Isso não apenas limita o engajamento da sociedade, mas também concentra o poder de decisão — sobre quais causas apoiar e de que forma — nas mãos de poucos.

Mas há um outro caminho.

As estratégias construídas de forma coletiva — também chamadas de collectively owned strategies — são uma alternativa para mudar esse cenário. Elas partem do entendimento de que ninguém, por mais experiente ou bem-intencionado que seja, tem sozinho todas as respostas para os desafios complexos que enfrentamos hoje. Esse tipo de estratégia exige escuta verdadeira, abertura para questionar o que está posto, disposição para o diálogo e um compromisso com soluções criadas em conjunto.

Quando organizações, movimentos, financiadores e comunidades definem juntos os problemas, as prioridades e os caminhos, o processo se torna mais democrático, mais conectado à realidade e, principalmente, mais eficaz. Não se trata de aplicar uma ideia pronta vinda de fora, mas de construir uma visão de futuro de forma colaborativa.

Um exemplo desse modelo é o Fundo Baobá para Equidade Racial. Criado com o objetivo de promover justiça racial no Brasil, o fundo atua de forma estruturante e com protagonismo negro. Sua governança é composta por pessoas negras, e suas decisões são tomadas com base em escuta e articulação com diferentes atores da sociedade civil, priorizando soluções que nascem dos próprios territórios. Ao fortalecer organizações lideradas por pessoas negras e apoiar causas historicamente subfinanciadas, o Baobá mostra como fundos filantrópicos coletivos podem redistribuir poder e gerar impacto.

Experiências como essa evidenciam o potencial das estratégias coletivas para ampliar o engajamento social e fortalecer o senso de pertencimento. Quando as pessoas sentem que fizeram parte da construção da estratégia, que foram ouvidas e que estão contribuindo para algo maior, o envolvimento se aprofunda e dura mais. É assim que começa a se formar uma verdadeira Cultura de Doação — baseada em confiança mútua, corresponsabilidade e continuidade, e não apenas em atos pontuais de generosidade de poucos.

Leia o texto completo no blog do Movimento por uma Cultura de Doação: www.doar.org.br/post/o-poder-das-estrategias-coletivas-para-transformar-realidades